Mandrake e o futuro da Ciência da Computação

Um colega da Microsoft que trabalha com a área educacional me relatou que o número de candidatos a uma vaga na área de Ciência da Computação nas Universidades caiu para ¼ do que tínhamos há alguns anos. Ele também me conta que o interesse tem se mantido muito mais pela empregabilidade do setor do que pelo amor à computação.

Este comportamento parece ser mundial. Sociedades como a ACM (Association of Computing Machinery) têm alertado sobre o problema e investido bastante em divulgar o lado criativo e multidisciplinar desta ciência.

Formei-me em Engenharia quando a micro computação estava chegando. Vivíamos a possibilidade de ter nossos próprios computadores e com o sonho de criar um novo mundo onde a inteligência artificial, automatização e outros iriam liberar a humanidade para uma vida melhor. O famoso HAL de “2001 uma Odisséia no Espaço” ainda estava nas nossas cabeças. E, é claro, havia também o sonho de ficar rico com alguma descoberta ou desenvolvimento.

Hoje o sonho continua, mas para bem poucos. A maioria dos empregos é para desenvolvimentos de pouca criatividade, como aplicativos departamentais ou páginas web simples. A rotatividade no emprego também é muito alta. Conheço empresas que chegam a ter a permanência de um empregado de apenas 9 meses/ano! Não é de espantar que o interesse diminua.

Quando vejo isto me lembro do pesadelo que adquiri a partir de uma leitura de uma revista do Mandrake na década de 70 - que me impressionou muito na época e continua povoando meus sonhos. Nesta estória, Mandrake e seu amigo Lotar tinham que investigar o desaparecimento de alunos novos e de QI altíssimos das escolas americanas. Na investigação, Mandrake e Lotar vêem dois homens estranhos levarem um menino para um portal do tempo e conseguem segui-los até um tempo futuro e distante. Lá conversam com os estranhos que lhes relatam o problema e a causa dos seqüestros: neste futuro a sociedade se encontra completamente automatizada e o computador garante toda infra-estrutura para que a humanidade viva e se divirta. Porém, a humanidade perdeu o gosto de enfrentar problemas difíceis. Não havia mais quem quisesse ou quem tivesse formação para dar manutenção aos sistemas existentes. Daí os seqüestros.

Não me lembro do fim da estória, se o Mandrake resgatou ou deixou os meninos salvarem a humanidade no futuro. Mas pouco importa, a visão continua terrível.

A ciência da computação é uma ciência nova (60 anos?). Cresceu muito rapidamente gerando sonhos irrealistas. Tornou-se com o tempo uma ciência com desenvolvimento mais lento. Desenvolvimento lento como as demais ciências - só isto. O que pode torná-la menos popular, mas não menos interessante.

Temos ainda problemas duros, como a inteligência artificial, a computação em paralelo, a resolução de problemas que exigem algoritmos não polinomiais, etc. Já ajudamos em todos os campos: Biologia, Finanças, Administração, etc.

Para ser mais sexies, talvez só precisemos de uma educação mais conectada à multidisciplinaridade do nosso tempo e uma visão empresarial que equilibre melhor o modelo indiano de serviço com o modelo americano de alto investimento em pesquisa e desenvolvimento. Caso contrário, estaremos cada vez mais e mais investindo para formar programadores COBOL para dar manutenção em sistemas caros e à baixo custo. Uau... exatamente o futuro que o Mandrake nos avisou que poderia acontecer.